O Secretariado Executivo da CNDH regista a primeira condenação em Portugal do crime de mutilação genital feminina (MGF), cinco anos após a tipificação deste crime no ordenamento jurídico português, punível com pena de dois a dez anos de prisão.

No passado dia 8 de janeiro, o Tribunal de Sintra condenou a três anos de prisão efetiva e a uma indemnização de dez mil euros uma mãe acusada do crime de mutilação genital feminina por ter permitido o corte da filha de um ano e meio durante uma viagem ao estrangeiro.

A mutilação genital feminina consiste em qualquer intervenção nefasta sobre os órgãos genitais femininos por razões não médicas, representando uma forma de violência contra as mulheres e raparigas, bem como uma violação dos direitos das mulheres e dos direitos da criança, contribuindo para a persistência de desigualdades de género.

Em 2015, o crime de mutilação genital feminina tornou-se autónomo no Código Penal português (artigo 144º-A), aplicável também a atos preparatórios e a atos que tenham acontecido fora de Portugal, numa alteração legislativa decorrente da aplicação à legislação portuguesa da Convenção de Istambul do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica. Este trata-se de um crime público, isto é, não depende de uma queixa da sobrevivente, pelo que qualquer cidadão/ã poderá alertar o Ministério Público, caso venha a ter conhecimento de um caso de mutilação genital feminina.

Em 2016, o primeiro inquérito aberto por crime enquadrável no artigo n.º 144-A foi arquivado sem ir a julgamento. Em 2017, foi aberto outro processo que envolvia mutilação genital feminina que também não resultou em acusação por esta prática. Em 2018, não houve nenhum inquérito aberto por mutilação genital feminina no país. De acordo com a Procuradoria-Geral da República, em 2019 houve sete processos abertos pelo Ministério Público por mutilação genital feminina (além do caso que resulta agora em acusação, cinco inquéritos foram arquivados e outro ainda se encontra em investigação).

Apesar dos avanços legais nesta matéria, que se refletem nesta primeira condenação, o estudo mais recente sobre mutilação genital feminina em Portugal, publicado pelo Observatório Nacional de Violência e Género em 2015, estima que residam em Portugal mais de 6500 mulheres com 15 ou mais anos que já tenham sido vítimas de mutilação genital, e cerca de 1830 meninas com menos de 15 anos que já tenham sido submetidas a esta prática ou que estarão em risco de o ser. A persistência destes casos demonstra que é urgente intensificar as políticas de sensibilização e de prevenção para a erradicação desta prática nefasta.

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